Wednesday, May 18, 2022

Control Z Delete

 Coisa difícil datilografar sem errar.


Um erro custava caro. 


O preço era tentar apagar sem rasgar o papel. Usando com carbono a tarefa se tornava mais difícil ainda. Pois o erro se dava em 2 ou mais cópias. Ainda, muitas vezes se apagava com sucesso, mas o passo seguinte seria o de reposicionar a folha no exato local onde os tipos atingiam o papel, mantendo a altura e posição do texto.


Daí então surgiu o editor de texto e tudo mudou. Pode-se errar a vontade. (como acabei de errar agora e você nem viu).


Pode-se inclusive desfazer totalmente um erro. Genial. Agora dá para experimentar sem o dissabor de cagar tudo. Basta um CRTL+Z! Maravilha! Blocos inteiros de qualquer coisa desfeitos e voltando ao status quo ante!


Isso é que é liberdade criativa! Um super papel higiênico que não deixa marcas. 


Mas o quanto isso tudo transformou as pessoas e o quanto disso vazou do mundo virtual para a nossa realidade física. O dia a dia, aquele, fora das telas?


É claro que as pessoas se acostumam com o que é fácil. Somos treinados para agir sempre pelo caminho mais fácil. Isso nos trouxe até aqui e certamente tem a ver com genes muito antigos. Não poderia ser diferente que abraçasse-mos tudo de bom que nos é oferecido e passemos a agir reproduzindo esse comportamento.


Será que esse novo costume, este novo agir, tem nos causado alguns problemas também? A falta de cautela, sabendo que uma ação pode ser desfeita, pode nos levar a realizar ações perigosas ou displicentes?

O que isso pode nos estar causando nos dias de hoje?


Dia desses um amigo me disse que a filha dele - já adulta - estraga os aparelhos de TV em 6 meses. E acrescentou que isso era porque “Apertava tudo que era botão que via”. 


A Fábrica de Cretinos Digitais. Este é o título do último livro do neurocientista francês Michel Desmurget, diretor de pesquisa do Instituto Nacional de Saúde da França, em que apresenta, com dados concretos e de forma conclusiva, como os dispositivos digitais estão afetando seriamente — e para o mal — o desenvolvimento neural de crianças e jovens. 


Porém os motivos apresentados pelo Dr Desmurget não parecem explicar como ou melhor, por quê isto está se dando. Vamos a algumas explicações dele:  


Dr Desmurget - Entrevista à BBC


BBC News Mundo: E o que está causando essa diminuição no QI?

Desmurget: Infelizmente, ainda não é possível determinar o papel específico de cada fator, incluindo por exemplo a poluição (especialmente a exposição precoce a pesticidas) ou a exposição a telas. O que sabemos com certeza é que, mesmo que o tempo de tela de uma criança não seja o único culpado, isso tem um efeito significativo em seu QI. Vários estudos têm mostrado que quando o uso de televisão ou videogame aumenta, o QI e o desenvolvimento cognitivo diminuem.

Os principais alicerces da nossa inteligência são afetados: linguagem, concentração, memória, cultura (definida como um corpo de conhecimento que nos ajuda a organizar e compreender o mundo). Em última análise, esses impactos levam a uma queda significativa no desempenho acadêmico.

 

BBC News Mundo: E por que o uso de dispositivos digitais causa tudo isso?

Desmurget: As causas também são claramente identificadas: diminuição da qualidade e quantidade das interações intrafamiliares, essenciais para o desenvolvimento da linguagem e do emocional; diminuição do tempo dedicado a outras atividades mais enriquecedoras (lição de casa, música, arte, leitura, etc.); perturbação do sono, que é quantitativamente reduzida e qualitativamente degradada; superestimulação da atenção, levando a distúrbios de concentração, aprendizagem e impulsividade; subestimulação intelectual, que impede o cérebro de desenvolver todo o seu potencial; e o sedentarismo excessivo que, além do desenvolvimento corporal, influencia a maturação cerebral.

 

BBC News Mundo: Que dano exatamente as telas causam ao sistema neurológico?

Desmurget: O cérebro não é um órgão "estável". Suas características 'finais' dependem da nossa experiência. O mundo em que vivemos, os desafios que enfrentamos, modificam tanto a estrutura quanto o seu funcionamento, e algumas regiões do cérebro se especializam, algumas redes são criadas e fortalecidas, outras se perdem, algumas se tornam mais densas e outras mais finas.

Observou-se que o tempo gasto em frente a uma tela para fins recreativos atrasa a maturação anatômica e funcional do cérebro em várias redes cognitivas relacionadas à linguagem e à atenção.

Deve-se ressaltar que nem todas as atividades alimentam a construção do cérebro com a mesma eficiência.

 

BBC News Mundo: O que isso quer dizer?

Desmurget: Atividades relacionadas à escola, trabalho intelectual, leitura, música, arte, esportes… todas têm um poder de estruturação e nutrição muito maior para o cérebro do que as telas.

Mas nada dura para sempre. O potencial para a plasticidade cerebral é extremo durante a infância e adolescência. Depois, ele começa a desaparecer. Ele não vai embora, mas se torna muito menos eficiente.

O cérebro pode ser comparado a uma massa de modelar. No início, é úmida e fácil de esculpir. Mas, com o tempo, fica mais seca e muito mais difícil de modelar. O problema com as telas é que elas alteram o desenvolvimento do cérebro de nossos filhos e o empobrecem.

 

BBC News Mundo: Todas as telas são igualmente prejudiciais?

Desmurget: Ninguém diz que a "revolução digital" é ruim e deve ser interrompida. Eu próprio passo boa parte do meu dia de trabalho com ferramentas digitais. E quando minha filha entrou na escola primária, comecei a ensiná-la a usar alguns softwares de escritório e a pesquisar informações na internet.

 

Os alunos devem aprender habilidades e ferramentas básicas de informática? Claro. Da mesma forma, pode a tecnologia digital ser uma ferramenta relevante no arsenal pedagógico dos professores? Claro, se faz parte de um projeto educacional estruturado e se o uso de um determinado software promove efetivamente a transmissão do conhecimento.

Porém, quando uma tela é colocada nas mãos de uma criança ou adolescente, quase sempre prevalecem os usos recreativos mais empobrecedores. Isso inclui, em ordem de importância: televisão, que continua sendo a tela número um de todas as idades (filmes, séries, clipes, etc.); depois os videogames (principalmente de ação e violentos) e, finalmente, na adolescência, um frenesi de autoexposição inútil nas redes sociais.

 

BBC News Mundo: Quanto tempo as crianças e os jovens costumam passar em frente às telas?

Desmurget: Em média, quase três horas por dia para crianças de 2 anos, cerca de cinco horas para crianças de 8 anos e mais de sete horas para adolescentes.

Isso significa que antes de completar 18 anos, nossos filhos terão passado o equivalente a 30 anos letivos em frente às telas ou, se preferir, 16 anos trabalhando em tempo integral!

É simplesmente insano e irresponsável.

 

O Dr Desmurget parece-nos simplificar e apontar uma causa notória, porém sem buscar ou explicar o real motivo desta transformação.

Como eram as provas escolares na época pré-digital? Havia o trauma da caneta de tinta. Por quê? Porque uma vez escrita e resposta à caneta, não se poderia apagar. Então era comum realizar um rascunho a lápis. Esse temor fazia com que o indivíduo se detivesse um pouco mais na elaboração da resposta. Fazia-o pensar. refletir antes de proceder uma ação. 

 

Nos jogos digitais, principalmente os de ação, há o respawn, que é o reaparecimento ou retorno à vida, após a morte. Nem a vida tem um fim absoluto neste cenário. Não há uma consequência para os atos.

 

Vamos exemplificar também através de dois quebra cabeças simples. Como seriam resolvidos por uma geração totalmente digital e outra não. Observe as duas figuras e os problemas propostos:






Provavelmente o método do indivíduo CTRL-Z será tentativa e erro. Lápis, borracha ou cliques em diversos lugares.

 

Já um indivíduo pré-digital ou com as características destes, irá realizar em sua mente um estudo de possibilidades e assim exercitando-a.

 

Qual terá um maior ganho após a brincadeira? Aquele que exercitou a mente ou aquele que exercitou os dedos? Para fins de adquirir a capacidade de resolver problemas, podemos deduzir que foi o primeiro. Mas quem resolveu mais rápido?

 

Por isso podemos teorizar que existe algo de positivo nesta mudança. Não se trata de uma idiotização, apenas adequações ao que mais a humanidade precisaria no seu caminho de evolução.

A empresa de aviação Airbus, cada vez mais transforma suas grandes aeronaves em robôs automatizados, cabendo ao piloto a função de controlador e observador. 

 

Tesla e Google avançam firmemente nos veículos autônomos.

 

Tanto o piloto da aeronave como o passageiro de um veículo autônomo não precisam saber detalhes muito específicos da máquina e software que utilizam. Basta saber usá-los. Não tem de ser criativos. Não há ambiente para isso.

 

Há uma história engraçada - certamente uma piada, mas que aponta o que tratamos aqui.

 

O gigante da alimentação, McDonald's, estaria fazendo uma seleção de novos funcionários e fez uma dinâmica para o grupo todo, umas 100 pessoas.

 

Quem se acha criativo aqui? Levantem-se por favor. Disse o recrutador ao microfone.

70% das pessoas se levantaram. Todos jovens querendo muito aquele emprego e mostrarem-se de forma especial.

 

A seguir o recrutador teria dito:

“Quem está de pé pode retirar-se da sala.”

Todos se entreolharam não acreditando que ao imaginar agradar a empresa e o recrutador, estavam selando o fim de sua trajetória naquela seleção.

Ao ver que seu objetivo havia sido atingido o recrutador voltou a se pronunciar:

“Todos podem sentar. Fiz isso para vocês saberem que aqui na companhia não queremos ninguém inventando novidades ou improvisando qualquer coisa. Queremos que sigam o manual!”

 

Isso tudo pode se tratar de uma readequação de pessoas e funções. A automação e a evolução tecnológica continuará sendo proposta por pessoas com o perfil adequado, criativo e inventivo. Estaremos enfrentando as consequências disso, ou seguiremos um caminho involutivo.

 

Novas habilidades as crianças submetidas às "telas" precocemente, irão desenvolver. Características necessárias no seu futuro cotidiano.

 

Outras consequências, bem vejamos:

 

Poderemos enfrentar, ao sancionar esta realidade, com problemas éticos muito profundos no futuro. Privar populações da tecnologia presente buscando uma melhoria nos coeficientes de inteligência, laboratórios de gênios ou coisas do tipo. Haverá algum governo totalitário para colocar isso em prática, talvez separar cidadãos em grupos para fins específicos, ou uma maluquice destas.

 

Afinal, com o QI baixando… pode-se confirmar, como dito por ninguém menos que A. Einsten, que a estupidez humana não tem limites mesmo. 

 

Oremos.